"Direito ao crédito deve estar na carta dos direitos humanos"
Colocar o "direito ao crédito" na carta fundamental dos direitos do Homem é o próximo desafio de Muhamad Yunus. Impossível? Talvez não. Para quem acredita há 30 anos que "é possível transformar utopias em realidade", nada é impossível. Afinal quando, em 1997, o "pai" do microcrédito conseguiu impor nos objectivos do milénio a meta de passar de 7,5 milhões de beneficiários do microcrédito para os 100 milhões até 2005, muitos poucos, para além dele próprio, acreditavam.
"Oito anos passados não só atingimos essa meta como julgo que a teremos mesmo ultrapassado, com um terço a sair da pobreza", disse, pleno de satisfação, o fundador bengali do Grameen Bank, falando para uma plateia de responsáveis governamentais e instituições de solidariedade nacionais, que despertam para a potencialidade do microcrédito.
Porquê lutar pelo direito ao crédito? "O meu argumento é o seguinte não adianta consagrar o direito à saúde, ao trabalho, à educação, tudo óptimas ideias, se todos sabemos que os Estados não têm dinheiro suficiente para fazer cumprir todos esses direitos. O que é importante, o direito fundamental, deve ser capacitar os indivíduos com os meios que lhes permitam ser autónomos, criando o seu próprio emprego".
E para quem não perceba, Yunus relembra que todos os homens nascem com a mesmas ferramentas, a mesma criatividade. "Os pobres são apenas pessoas bonsai. Tal como as árvores se forem colocadas em vasos pequenos sem espaço para crescer nunca ultrapassam um determinado tamanho". O microcrédito, diz, é o espaço para crescerem.
Alargar o microcrédito e reforçar a sua dimensão em África e na América Latina, mas também na Europa, é agora a prioridade deste movimento que conta com uma rede mundial de organizações não governamentais. É que dos 100 milhões de abrangidos até aqui, cerca de 90 milhões situa-se no continente asiático, em particular no Bangladesh e na Índia, onde em cada país, o programa tocou 17 milhões de pessoas pobres.
Enquanto nos países em vias de desenvolvimento este instrumento é sobretudo direccionado a pessoas muito pobres, com os montantes médios de empréstimo a não irem muito além dos 100 euros, na Europa e nos Estados Unidos, o microcrédito está a constituir-se como um meio de incentivar o empreeendedorismo de pessoas vítimas de reestruturações empresariais, que caíram no desemprego prolongado.
Afinal, em Portugal, cerca de 10% dos "clientes" têm formação superior. O mesmo se passa nos países da Europa central e de leste, onde este instrumento está a ser utilizado por pessoas com qualificação superior.
Porque acredita na força dos pequenos passos, Muhamad Yunus já definiu a meta de financiar mais 75 milhões de pessoas em todo o mundo daqui até 2015. É também com pequenos passos que - muito devido ao microcrédito -, no Bangladesh se tem reduzido a taxa de pobreza em 1% ao ano na última década. E como agora a redução está a ser mais rápida, Yunus acredita que "não estamos assim tão longe de atingir a meta de reduzir para metade a taxa de pobreza extrema até 2015". E a fé alimenta-se de exemplos o Grameen Bank começou a financiar pedintes com 9 euros para que em vez de pedirem vendessem alguma coisa. Hoje, há 65 mil pedintes no programa, que não se limitam a pedir. "É possível mudar o mundo", diz. Uns mudam, outros não.
in DN Online 2006-01-24
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