sábado, julho 12, 2008

Fannie Mae e Freddie Mac: o centro da crise

A crise hipotecária nos EUA atingiu esta semana o seu auge, certa de um ano depois de começar. Na semana em que a maior parte dos mercados mundiais entraram oficialmente em bear market (designaçao que lhes é dada depois de cairem mais de 20% desde o ultimo máximo), duas empresas estiveram em especial destaque, pelo seu comportamento em bolsa, mas especialmente pela sua importância na maior economia do mundo.

A Federal National Mortgage Association (mais conhecida pelo acrónimo Fannie Mae) e a Federal Home Loan Mortgage Corporation (com o acrónimo Freddie Mac) sao GSEs (Government Sponsored Enterprises) mas detidas por stockholders (investidores, como qualquer outra empresa cotada em bolsa). Tanto a Fannie Mae como a Freddie Mac tem como negócio financiar hipotecas (a outras entidades financeiras) ou garantir essas hipotecas, e como contrapartida (e daqui vem o seu lucro) vender MBS (mortgage backed securities), que nao sao mais do que pacotes de hipotecas que financiou ou garantiu, mas cuja reuniao em pacotes permite vender por um preço mais elevado do que se o fizesse individualmente, via efeito de diversificaçao de risco. Por outras palavras, empresta dinheiro a entidades financeiras que fazem emprestimos para comprar casa a clientes, e por outro lado, investidores de MBS emprestam-lhes dinheiro; via efeito de diversificaçao, a taxa que cobram é maior que a taxa que pagam, pelo que o seu negocio é na pratica securitizar hipotecas.

A criaçao destas entidades permitiu dar liquidez ao mercado de hipotecas nos EUA, e foi uma forma de universalizar o acesso a uma habitação própria aos americanos. Foi portanto uma politica social, iniciada em 1968 e intensificada e massificada a partir de 2000. Para aqueles que olham os EUA como o centro do capitalismo, esta foi uma forma via mercado de tornar possivel que muitos americanos pudessem ter uma casa propria.

Contudo, a espiral de preços das casas teve um forte revés há cerca de 2 / 3 anos atras. Em julho de 2007 estourou a crise do subprime, e muitas das entidades financeiras que detinham hipotecas ou instrumentos derivados de hipotecas subprime, viram o seu patrimonio desaparecer, e muitas foram inclusivamente à falencia.

Contudo, estas duas GSEs, não estao no negocio do subprime, as suas hipotecas sao na esmagadora maioria de qualidade superior (prime ou near-prime). No entanto, as hipotecas que detem correspondem a metade do valor total de hipotecas dos EUA, isto é, detém ou securitizam cerca de 5 trillion USD (5 biliões de USD) do total de 12 trillion USD.

Tanto a Fannie Mae como a Freddie Mac esta semana desvalorizaram-se cerca de 70% em bolsa , com rumores que estariam em falencia técnica segundo os critérios contabilisticos em vigor nos EUA, onde os MBS (e todos os activos) teriam de ser avaliados ao fair price (ou seja, em caso de liquidação imediata, qual o seu valor no mercado). Sendo que o mercado de MBS está praticamente "morto", estes activos, apesar do valor intrinseco, tem um baixissimo valor de mercado, devido à escassez de procura.

Sendo GSEs, tanto a Fannie Mae como a Freddie Mac tem uma garantia implicita do Governo Norte-Americano, que assegura a sua divida tacitamente. Contudo, isto nao implica que reste algum valor para os accionistas...

Em caso de tomada firme pelo Governo Americano destas GSEs, a divida publica Norte-Americana praticamente duplica, pelo que será a maior injecçao de capitais publicos para obra social que ha memória...

Nada mau para o centro do capitalismo e imperialismo que tantos odeiam...

2 comentários:

RM disse...

Caro Carlos Martins
Este post suscita-me vários problemas que, veja a minha desdita, minam a minha fé no capitalismo e no liberalismo económico.
1- Então o (livre) mercado não consegue dar a volta a este problema? Porque será?
2- Porque é que será que o capitalismo (e principalmente os capitalistas) são tão liberais quando está tudo a correr bem (vg quando estão a encher a malvada) e se tornam tão crentes no Estado Providência quando as coisas dão para o torto?
3- Razão tem a minha prima Efigénia quando afirma que neste "sistema" os lucros são privados mas os prejuizos são sempre públicos (e mesmo assim ainda há alguns que cospem na sopa).
Abraço
Raul Martins
Abraço

Carlos Martins disse...

a sua questao tem alguma razao com um senao: muito provavelmente o Estado vai lucrar com a tomada firme destas empresas. O valor destes MBSs que estao em enorme desvalorizaçao nao sera tao acentuado como o mercado desconta nesta altura, pelo que os proprios contribuintes vao comprar barato e vender caro. Novamente.