Muitos de nós, jovens, nunca terão vivido qualquer verdadeira recessão económica, quanto mais uma depressão. Aliás, mesmo aqueles jovens mais atentos à evolução da sociedade e da civilização nunca talvez ponderaram, sequer, que chegasse uma altura em que tanto pode estar hipotecado no seu futuro, como indivíduos, e acima de tudo como sociedade.
Com a quantidade de dissertações sobre a actual crise, importa reflectir sobre como tirar partido da actual situação e, se possível, o que aprender para tornar a sociedade como um todo melhor, queira isso dizer uma nacionalização total dos meios de produção e um novo caminho de mercado para optimizar os recursos disponíveis.
O choque na procura mundial por bens e serviços vai eliminar milhões de postos de trabalho e causar a falência de inúmeras empresas, grande e pequenas. Todo o mundo até aqui considerado próspero, fora construido sobre um enorme balão de crédito, que subitamente deixou de existir. E sobre este enorme redimensionamento da economia mundial, pouco haverá a fazer, a não ser suavizar alguns efeitos mais devastadores do ponto de vista humano. Mas é indispensável olhar para o futuro – em todo o mundo, e em particular em Portugal – de uma perspectiva de transformação, de inovação, de construção, de optimismo, sob pena de se perder uma oportunidade única – talvez em séculos – de lançar as bases para uma sociedade e uma economia sustentável e competitiva. Por mais doloroso que possa ser a transição, nomeadamente ao nível do desemprego com as consequentes crises sociais, é um período crítico de inovação. É este o momento das grandes decisões. É agora possível adequar e redimensionar empresas que viveram anos de constrangimento legal para despedir funcionários não produtivos ou excedentários (e isto aplicar-se-ia à função pública, não fosse o inevitável eleitoralismo); é agora possível criar um espírito de competição e mérito, onde a enorme massa de capital humano disponível para trabalhar irá competir não só para manter o posto de trabalho, no caso dos empregados, como para conseguir o melhor emprego possível, no caso dos desempregados (é talvez uma forma cínica de incentivo à produtividade que durante largos períodos andou afastada das relações laborais); é agora possível eliminar do tecido empresarial as empresas não competivivas, numa verdadeira selecção natural darwiniana; é agora possível ver as vantagens de uma economia de mercado forte, mas também as fragilidades do Estado para regular; é, enfim, agora possível elencar as vantagens da integração europeia e da moeda única, cuja presença de Portugal lhe permitiu manter as portas do crédito abertas para continuar a financiar a dívida pública, manter uma moeda estável e taxas de juro adequadamente baixas sem preocupações de ataques cambiais.
Mas nem tudo passa pelos agentes económicos. Cabe também ao Estado como supervisor, regulador e entidade responsável por evitar excessos (tarefa que lhe foi confiada e paga a peso de outro pelos contribuintes) a tomada de decisões orçamentais e fiscais adequadas, e acima de tudo, responsável. Depois do natural choque inicial, é necessário implementar medidas arrojadas. Os constrangimentos são, contudo, enormes, mas a altura é a ideal, tanto do ponto de vista de disponibilidade dos eleitores, como da flexibilidade das autoridades europeias nas contas públicas. A margem de erro é, contudo, reduzida, com os mercados a vigiarem de muito perto a viabilidade do próprio país para contrair mais dívida. Assim, urge impor medidas orçamentais estruturais, ou seja, evitar a tentação do keynesianismo das obras públicas, cujo efeito de curto prazo desaparece, mas a dívida fica, e apostar na competitividade fiscal e atractividade de investimento de qualidade. E acima de tudo, evitar ineficiências e injustiças fiscais; impor definitivamente uma política onde o contribuinte perceba por que paga impostos e qual o seu destino. E fazer isto tudo, com o intuito de suavizar efeitos da crise, mas lançando bases para o futuro.
Mas não será só a economia que marcará este período. É normalmente nestas alturas mais depressivas que a criatividade surge e se manifesta mais intensamente. É, portanto, previsível, que a criação artistica sofra novo impulso, nas suas diversas vertentes, inspirada na variedade de dramas humanos e temáticas sombrias que estão a assolar o mundo. A manifestação e a concretização na arte dos desesperos sempre trouxe um novo fôlego à pintura, música e literatura. Verdadeiros legados de como é viver tempos sombrios e difíceis. Também aqui poderemos um dia olhar para este período e ver como a sua intensidade espoletou obras intemporais, para além da memória e da experiência pessoal de entender que o mundo nem sempre mantém a rota de felicidade que aparenta; mas que é nas assimptotas que reside a força da humanidade para se renovar, recriar e reaparecer mais forte e mais sustentada.
in Jornal "O Jovem" da JP da Maia
3 comentários:
Temo que, por entre as brumas, ainda estejamos à espera do arauto das soluções milagrosas: um qualquer Dom Sebastião, agora estilizado e com tiques de tecnocracia.
A situação hodierna em Portugal (porque é essa que nos toca em primeiro plano!) não comporta mais desculpas relacionadas com pseudo-periferias geográficas e calamidades de proporção mundial. Por mais que isso possa ter algum fundo de verdade, admitamos que, a exemplo de quase toda a História de Portugal somos sempre os últimos.
E, por ora, "ser o último" é mais uma pazada na enorme cratera que é a realidade sócio-económica-cultural nacional.
É-nos intrínseco. É mais que latinidade. É lusitaniedade Queixamo-nos. Não agimos. Aguardamos. Voltamo-nos a queixar e, em bicos de pés, porque somos muito pequeninos, fazemos mais uma vénia para que, lá do centro da Europa continue a chover e o vento sopre Sudoeste.
Mas o nevoeiro continua cerrado.
Este Dom Sebastião em estado hibernatório, com o número de Eládio Clímaco na mão, apenas queda atento às evoluções metereológicas.
Vento fraco para amanhã.
Um abraço, Carlos!
Grande Sardo !! Grande Eládio !! :) Do Buy ! :P
Quem já é rico, há de continuar! :D
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